Revelar novos artistas, democratizar a cultura musical e buscar novas tecnologias são tarefas às quais João Marcello Bôscoli se dedica cotidianamente. Há 13 anos no comando da gravadora Trama, o produtor enche a boca para falar das conquistas alcançadas. O Álbum Virtual é uma delas: discos inteiros que podem ser baixados de maneira legal e gratuita. Estudioso das tendências mundiais do mercado fonográfico, diz que a crise do disco pré-gravado era previsível. Nascido em berço musical (filho de Ronaldo Bôscoli e Elis Regina) e prestes a ser pai pela primeira vez, programa para o ano que vem uma série de homenagens a sua mãe. "Acho que é uma maneira de devolver à sociedade um pouco do trabalho dela". Abaixo, trechos da entrevista.
Já sabíamos que haveria uma expansão da música. Dois anos antes do Myspace, em 2003, lançamos uma ferramenta de autopublicação de músicas, a Trama Virtual. Fizemos isso porque arquivávamos muitos demos. Chegamos a ter seis mil. Não dá para lançar seis mil artistas por ano. Por isso criamos uma vitrine virtual. Temos também download remunerado, em que cada vez que uma música é baixada, uma marca paga para o artista.
É uma solução para o mundo digital. Nele existe direção de arte, a sequência das músicas. O artista tem o controle da qualidade da obra. Ficamos felizes porque um ano e oito meses depois, a Apple lançou o iTunes LP, mostrando que estamos no caminho certo.
Compro. Mas claro, houve uma crise específica no formato do disco pré-gravado. Mas isso já estava desenhado. Se a mídia física vai continuar existindo, é uma decisão da sociedade. Me parece que as pessoas têm uma relação especial com algo físico. A fita cassete, por exemplo, está começando a voltar. Agora, o show, a camiseta, o boné... isso é para sempre.
Acho que sim. É muito mais barato produzir um disco hoje em dia. Além de ser possível publicar o álbum na rede sem perguntar nada para ninguém. No que diz respeito aos rendimentos financeiros, os shows sempre foram mais importantes. O que pagou minha escola foram os show da Elis e não os discos dela.
É maravilhoso. Independentemente de ser minha mãe, gosto da obra da Elis Regina. Acho que é uma maneira de devolver para sociedade um pouco do trabalho dela.
Esses grandes nomes a gente escuta sempre, mas com parcimônia. Porque é uma obra vasta, linda, mas finita. Existem períodos certos para escutar (risos).
O nosso papel de herdeiro é liberar. Se alguém quer fazer, só damos uma olhada antes, mas costumamos aprovar. Por mim, quanto mais, melhor.
Acho que o método de arrecadação pode melhorar. Sobretudo em uma estrutura burocratizada como é no Brasil. Pessoas mais experientes do que eu, que participaram da Ecad, dizem que antes era pior porque não era centralizado. Na prática, claro, existem muitas falhas.
Não existe muita variação para o Ecad. É necessário, em algum momento, que uma entidade faça a gestão do acervo musical. Pode melhorar, mas não dá para deixar de existir. Ou cria-se outra entidade com uma função muito parecida. Como já existe, me parece que é melhor refinar.
Como avalia a Ana de Hollanda no MinC?
Acho muito cedo para avaliar. O que eu percebo é que as pessoas esperavam menos. Achavam que ela ia ser mais suave, quase decorativa. Mas tem se mostrado uma pessoa de opinião. Pessoalmente quem eu gostaria ver como ministro da Cultura é o Danilo Miranda, do Sesc. Não é só porque ele gosta de arte, mas por sua experiência administrativa.
O que entendo das leis de incentivo: 4% do lucro de uma empresa que pode ser investido em cultura. Os outros 96% ela tem que pagar o imposto normal. É um dinheiro importante para uma pasta de orçamento tão baixo. Acho um bom recurso, apesar da Trama só ter usado uma vez. Agora, a discussão dos critérios para esses 4% é subjetiva. Alguns dizem que é dever do ministério escolher quem pode usufruir. Outros defendem que essa função deveria ser da empresa que irá fomentar.
A Bethânia está dentro da lei. E de uma lei que eu acho válida. Na minha opinião, ela não merecia essa hostilidade.
Achei fantástico. É raro alguém querer fazer algo sobre um compositor, um produtor. Mateus Solano foi ótimo interpretando meu pai na série Maysa. Ele fez os trejeitos iguaizinhos.
Nota publica por Estadão em 27/06/11
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